Incerteza Aguda
Como a Incerteza afeta o desenvolvimento econômico do Brasil
Pedro Fernandes
10/31/20243 min read
Como economista, sou frequentemente questionado sobre questões difíceis, como “Por que o Brasil é pobre?” ou “Por que o Brasil é tão desigual?” Essas perguntas são desafiadoras porque têm múltiplas respostas válidas, incluindo instituições de baixa qualidade, baixa capacidade estatal, baixo investimento público, elites cleptocraticas e mais.No entanto, neste breve ensaio, gostaria de discutir uma das explicações corretas para o infortúnio do desenvolvimento do Brasil: o alto nível de incerteza macroeconômica
Mas por que a incerteza é importante? Bem, o caminho para o crescimento econômico contínuo requer estabilidade nas expectativas dos consumidores, empreendedores e investidores. É essencial ter, pelo menos, uma noção da direção das tendências econômicas.
Por exemplo, investidores estrangeiros precisam entender como variáveis como moeda e taxas de juros podem flutuar no curto ou médio prazo. Empreendedores buscam clareza sobre a demanda futura por produtos nos próximos dois ou mais anos para tomar decisões sobre investimentos adicionais.
Os chefes de famílias também querem saber se estarão trabalhando nos próximos anos para decidir se compram uma casa ou continuam locando. É fácil ver que baixa incerteza encoraja pessoas, empresas e famílias a investir. Um fluxo contínuo de investimentos é um dos fundamentos para um país alcançar um crescimento econômico estável e sustentado.
Empiricamente, um artigo recentemente aceito na Econometrica[1] demonstra, através de um experimento com empresas na Nova Zelândia, que o aumento da incerteza macroeconômica resulta em redução de preços, diminuição do investimento em inovação ou novas instalações e menos contratações. Os resultados também indicam uma diminuição nas vendas.
Quanto ao impacto nas famílias, uma abordagem semelhante empregada por economistas do Banco Central Europeu[2] revelou que maior incerteza conduziu a redução nos gastos com bens e serviços não duráveis, bem como a queda na demanda por pacotes de férias e itens de luxo.
A partir dessas considerações, não é estranho estabelecer que um princípio fundamental no design e condução da política econômica deve ser reduzir a incerteza, aumentando assim a previsibilidade, bem como promover confiança de que o governo está comprometido em garantir a estabilidade e assegurar o cumprimento das regras estabelecidas do jogo econômico.
Mas e quanto ao Brasil? Bem, num período de cinco meses, o novo governo fez mudanças drásticas nas regras relacionadas a concessões de serviços de saneamento e distribuição de água, interrompendo uma onda de investimentos elevados e de longo prazo iniciada a partir do novo marco legal do saneamento básico implementado há menos de dois anos.
No nível macroeconômico e de auto regulação, o governo descartou as regras fiscais existentes e propôs um novo conjunto que prioriza a manutenção do crescimento real dos gastos governamentais sem menção a controle de qualidade, através da adoção de práticas avaliativas como revisão de despesas, ou de medidas punitivas em caso de não cumprimento das metas e restrições propostas pelo novo arcabouço.
No Brasil, outra fonte significativa de incerteza é o sistema tributário. Reformá-lo deveria ser a prioridade máxima. No entanto, os esforços do governo estão concentrados em fornecer benefícios fiscais para a indústria automobilística. Isto é, em causar mais distorções tributárias.
O interessante é que em abril, o Tribunal de Contas da União divulgou auditoria que fez sobre o PADR, uma política de subsidio ao setor automotivo, e demonstrou que esta apesar de ter custado R$ 50 bilhões em 10 anos, e representar um custo de R$ 36 mil por emprego gerado, não produziu desenvolvimento econômico, nem inovação, seus objetivos declarados na ocasião de sua implementação.
Contribuindo ainda mais para a manutenção da incerteza, o governo anunciou o fim da política de paridade internacional de preços para gasolina e diesel, indicando sua intenção de retornar a uma política de subsídios para esses produtos. O governo de Dilma seguiu abordagem semelhante, o resultado foi uma perda de US$ 40 bilhões para a Petrobras.Infelizmente, eu poderia continuar e fornecer mais exemplos de decisões governamentais que aumentam a incerteza, mas acredito que já esteja claro para você, meu caro leitor, que o governo parece estar seguindo um caminho que aumentará a incerteza e, mais uma vez, impedirá o país de alcançar o tão sonhado caminho para o desenvolvimento econômico.
[1] The effect of macroeconomic uncertainty on firm decisions | CEPR
[2] https://www.ecb.europa.eu/pub/pdf/scpwps/ecb.wp2557~ec9c40e06d.en.pdf